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Com Trump, crescimento do comércio internacional é um "desafio"

São Paulo, 24 de Novembro de 2016 às 09:00 por Redação DC

É o que diz o Ronaldo Costa Filho, responsável pelas negociações internacionais do Itamaraty. Ele participará em São Paulo da abertura do seminário sobre o Mercosul, promovido pelo CECIEx e Apex, com apoio da Facesp.

Aumentar o volume do comércio internacional após a eleição de Donald Trump para a Presidência dos Estados Unidos é um desafio, mas não uma impossibilidade.

É o que afirma, em entrevista ao Diário do Comércio, o embaixador Ronaldo Costa Filho, diretor do Departamento de Negociações Internacionais do Itamaraty.

Costa Filho, em companhia do ministro das Relações Exteriores, José Serra, participará da abertura, em São Paulo, do seminário sobre "O Novo Mercosul - desdobramentos e impactos nas exportações brasileiras".

Trump
, eleito para a sucessão de Barack Obama, demonstrou durante sua campanha uma postura protecionista, que poderia se traduzir pela retração norte-americana nas transações mundiais, com impacto no conjunto global das transações.

O seminário sobre o Mercosul, entre 29 de novembro e 1o de dezembro, é promovido pelo Conselho Brasileiro das Empresas Comerciais Importadoras e Exportadoras (CECIEx) e pela Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos (Apex).

A seguir, a íntegra da entrevista do embaixador Ronaldo Costa.
Ainda podemos investir e dar credibilidade ao Mercosul, sobretudo com a crise que ele hoje atravessa, com a pendência da participação da Venezuela?


O Mercosul continua a ser para todos os seus integrantes um projeto atual e relevante. Todos estão interessados em preservar e aperfeiçoar seus mecanismos, revitalizar a integração por meio de negociações.

A questão da Venezuela é de governo e não de Estado. É algo mais circunstancial [N.D.R - o governo de Nicolas Maduro pode ser suspenso por não cumprir as cláusulas de adesão].

Até que ponto o modelo do Mercosul minimizou os impactos das oscilações de câmbio entre os países membros, permitindo uma concorrência desleal, como já aconteceu entre o Brasil e a Argentina?


Temos de conviver com essas questões e demonstrar vontade política para negociar. A única maneira de isolar a questão do câmbio consistiria em teoricamente adotarmos uma moeda comum, o que não é assunto no horizonte.
COSTA FILHO: MANTER CRESCIMENTO É DESAFIO ESTIMULANTE
O que vemos é a vontade conjunta de trabalharmos por uma maior estabilidade econômica de cada um dos países, para que a questão das diferenças cambiais sejam minimizadas.

Quando surgiu, em 1991, o perfil comercial do Mercosul era o de cada membro ter no outro seu principal parceiro. Mas eis que, a partir dos anos 2000, a China entra na região de modo agressivo. Brasil e Argentina, por exemplo, fazem hoje mais comércio com os chineses do que entre si.


O crescimento da importância da China foi benéfico para todos os integrantes do Merosul, não apenas como compradora ou exportadora de bens importantes na pauta de cada um. A China se tornou também uma grande investidora.

O fato de o Brasil deixar de ser o primeiro parceiro comercial da Argentina, por exemplo, não representa um real problema.

Até que ponto a chegada há um ano de Maurício Macri ao poder na Argentina, e meses depois a de Michel Temer, no Brasil, teriam melhorado o Mercosul em razão de uma certa desideologização?


Não creio que seja essa a ênfase. A verdade é que os novos governos na Argentina e no Brasil permitiram a adoção de uma visão mais pragmática, de olho em resultados concretos na economia e no comércio. É essa a questão que o Mercosul precisa constantemente responder.

Depois da passagem de quatro para cinco membros, com a Venezuela, ainda há espaço para que o Mercosul cresça, atraindo, por exemplo, os países sul-americanos que não mais terão a Parceria Transpacífico, que os Estados Unidos abandonarão com Donald Trump?


O Mercosul continua a crescer. A Bolívia está em processo de adesão plena e será o sexto membro. Já assinou o protocolo de adesão e está agora em processo de aprovação no plano parlamentar.

Quanto à questão da Parceria Transpacífico, há por enquanto apenas muita especulação. A promessa de campanha do presidente eleito dos Estados Unidos precisa ser confirmada com a posse de seu governo.

Por enquanto, estamos apenas no campo da adivinhação. Se esse projeto comercial prosperar, não acredito que haja um impacto gigantesco.

Mas haveria alguma relação entre o congelamento daquele bloco e a aproximação maior do Mercosul com o Chile, Peru ou Colômbia?


Não há entre as duas coisas nenhuma relação. O que existe são as negociações dentro da região. Já temos acordos de livre comércio com todos esses nossos vizinhos. E estamos agora aprofundando negociações para incluir serviços ou compras governamentais.

O Mercosul negocia constantemente com a Colômbia, Chile, Peru e México. A rigor, os únicos parceiros comerciais com os quais não temos acordo de livre comércio são os países da Ásia.

Como estão os planos de expansão com os asiáticos?


O diálogo sempre existiu. Ainda nesta semana o Mercosul se reuniu em Buenos Aires com a Coreia do Sul. Também estamos dialogando com o Japão e outros países da região.

O sr. acredita que, com Trump, ocorra um refluxo do comércio internacional?


É provável que a eleição de Donald Trump tenha refletido o sentimento de parcelas da população dos Estados Unidos que não se sentiram beneficiadas pelos acordos comerciais cada vez mais amplos e pela globalização.

Essa frustração representa para todos nós uma oportunidade para conhecermos melhor esses conjuntos de problemas. Manter em crescimento o comércio internacional será agora, para nós, um desafio que nos estimula.